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7 de octubre
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Chacrinha
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Como tanto hablan de Chacrinha, prendí el televisor para ver su programa, que me pareció duró más de
una hora. Y me quedé asombrada. Me dicen que este programa es actualmente el más popular. ¿Pero cómo? El
hombre tiene algo de loco, y estoy usando la palabra doido en su verdadero sentido. El auditorio lleno.
Es un programa para aficionados, por lo menos por lo que vi. Ocupa el llamado horario central de la
televisión. El hombre se viste con ropas locas, el aficionado presenta su número y, si no gusta, la bocina de
Chacrinha funciona, despidiéndolo. Además, Chacrinha tiene algo sádico: siente placer al hacer uso de su bocina.
Y sus chistes se repiten todo el tiempo — o le falta imaginación o es obcecado. ¿Y los aficionados? Qué
deprimente. Son de todas las edades. Y en todas las edades se percibe el ansia de aparecer, mostrarse, volverse
famoso, incluso al precio del ridículo o la humillación. Van viejos de hasta setenta años. Salvo algunas excepciones,
los aficionados que son de origen humilde tienen aspecto de desnutridos. Y el auditorio aplaude. Hay premios en
dinero para los que acierten por medio de cartas el número de bocinazos que Chacrinha hará sonar; por lo menos
fue así en el programa que vi. ¿Será por la posibilidad de ganar dinero, como con la lotería, que el programa tiene
tal popularidad? ¿O será por la pobreza de espíritu de nuestro pueblo? ¿O será que los telespectadores tienen en sí
un poco de sadismo que se complace con el sadismo de Chacrinha? No comprendo.
Nuestra televisión, con excepciones, es pobre, además de atiborrada de publicidades. Pero Chacrinha me
superó. Directamente no comprendí el fenómeno. Y me quedé triste, decepcionada: querría un pueblo más exigente.
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7 de outubro
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Chacrinha
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De tanto falarem em Chacrinha, liguei a televisão para seu programa que me pareceu durar mais que uma
hora. E fiquei pasma. Dizem-me que esse programa é atualmente o mais popular. Mas como? O homem tem qualquer
coisa de doido, e estou usando a palavra doido no seu verdadeiro sentido. O auditório também cheio.
É um programa de calouros, pelo menos o que eu vi. Ocupa a chamada hora nobre da televisão. O homem
se veste com roupas loucas, o calouro apresenta o seu número e, se não agrada, a buzina do Chacrinha funciona,
despedindo-o. Além do mais, Chacrinha tem algo de sádico: sente-se o prazer que tem em usar a buzina.
E suas gracinhas se repetem a todo o instante – falta-lhe imaginação ou ele é obcecado. E os calouros?
Como é deprimente. São de todas as idades. E em todas as idades vê-se a ânsia de aparecer, de se mostrar, de se
tornar famoso, mesmo à custa do ridículo ou da humilhação. Vêm velhos até de setenta anos. Com exceções, os
calouros são de origem humilde, têm ar de subnutridos. E o auditório aplaude. Há prêmios em dinheiro para os que
acertarem através de cartas o número de buzinadas que Chacrinha dará; pelo menos foi assim no programa que vi.
Será pela possibilidade da sorte de ganhar dinheiro, como em loteria, que o programa tem tal popularidade?
Ou será por pobreza de espírito de nosso povo? Ou será que os telespectadores têm em si um pouco de sadismo
que se compraz no sadismo de Chacrinha? Não entendo. Nossa televisão, com exceções, é pobre, além de superlotada
de anúncios. Mas Chacrinha foi demais. Simplesmente não entendi o fenômeno.
E fiquei triste, decepcionada: eu quereria um povo mais exigente.
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Clarice Lispector
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Revelación de un mundo
Título original: A descoberta do mundo
Traducción: Amalia Sato
Adriana Hidalgo editora S.A. 2005
Buenos Aires
1967
Jornal do Brasil
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Concordo plenamente com Clarice, era ela uma mulher sábia, compenetrada em seu mundo; nos deixou uma riqueza literária incrível e invejada. Ao contrário este mundo efêmero mostrado por Chacrinha semanalmente nas telas, pode ter a responsabilidade da mediocridade que cada vez mais vem sendo apresentada como arte!